quinta-feira, 23 de abril de 2020

A Modernidade e as tensões entre a Ciência e a Religião



A Filosofia Moderna foi um movimento de busca pela autonomia da razão humana em relação à religião. Na Idade Media, a religião era a autoridade máxima, e, embora a ciência tenha surgido aí e o espírito inventivo e experimental tenha se beneficiado do otimismo cristão em relação ao mundo, toda forma de conhecimento natural estava sempre submetida à Igreja. A Filosofia, que se desenvolveu muitíssimo no período medieval, sobretudo com os escolásticos, era chamada de "serva da teologia", e se houvesse qualquer discordância entre a teologia e qualquer ramo das ciências naturais, já se sabia de antemão que o erro estava no lado dessas últimas.

A Idade Moderna buscará a independência do saber humano. Surgirá uma vida intelectual fora do ambiente das universidades medievais, que eram terrenos eclesiásticos, e se lutará pelo desenvolvimento sem limites da razão natural. As ciências medievais tinham um caráter sobretudo contemplativo, não instrumental. Agora, porém, as ciências visarão conhecer o mundo para que este possa ser manipulado em função do conforto humano. A ciência, por este motivo, se desenvolve intensamente e o espírito da época marca uma passagem de autoridade: se antes a referência dos mistérios do mundo era a Igreja, agora o cajado é passado à ciência. Para compreendermos essa passagem, basta perguntar: quem procuramos hoje quando estamos doentes? Um padre/pastor ou um médico? Com algumas exceções, a maioria, ainda que não descarte as orações, procura o médico e o seu saber científico.

Galileu Galilei representou bem esse movimento de passagem. Demonstrando, por meio de observações, que não era o sol que girava em torno da terra, mas o contrário, ele ajudou a estabelecer uma visão de mundo totalmente nova, fato que chamou a atenção da Igreja porque parecia que a contrariava. Acontecia, então, um dos primeiros atritos históricos entre a Ciência e as crenças estabelecidas ou inspiradas na religião. Não é que Galileu fosse ateu ou antirreligioso. Ele era um católico devoto e, como tal, acreditava na função sagrada da Igreja. Do que se tratava, então? Uma frase sua expressará o motivo da divergência: "A Sagrada Escritura diz como se vai ao Céu, e não como vai o céu". 

Dizendo isto, Galileu afirmava que o terreno atuado pela Igreja, o da Fé e o da Moral, era diferente do terreno da Ciência, que buscava dizer como o universo se comporta. A Religião não podia ter a pretensão, segundo ele, de fazer afirmações científicas, pois fugiria, assim, do seu campo original. 

Era então o período da Contra Reforma, um movimento católico de resposta à Reforma Protestante iniciada por Lutero. Grande parte da polêmica luterana se deveu justamente à interpretação das Escrituras. Agora, num momento de grande sensibilidade, Galileu aparece dando lições à Igreja de como a Sagrada Escritura deve ser lida. O conflito se acirrou e Galileu foi condenado pela Inquisição à prisão domiciliar e a abjurar as suas teses.

Essas tensões entre a religião e a ciência foram se repetindo no decorrer da história, às vezes assumindo a forma de um atrito entre ciência e ética. Até hoje, a ciência se vê restringida por ter de respeitar os limites morais vigentes. Não é parte da ciência dizer se algo é correto ou errado. Cabe à ética essa função. Por isso, a religião sempre se verá impedida de extrapolar certos limites. As armas nucleares são exemplos clássicos de como a ciência pode não somente contribuir para o desenvolvimento humano, mas também pode nos aproximar da barbárie. Outros pontos moralmente sensíveis tratados pela ciência são a questão da clonagem, da inseminação artificial, o discurso sobre o momento exato em que começa a vida, o uso de células tronco embrionárias, etc.

Esse movimento de confiança exacerbada na razão, que caracteriza a modernidade, culminará na experiência das duas guerras mundiais e numa reação, em seguida, exatamente oposta: a de desconfiança na razão e de desesperança na bondade humana.

quinta-feira, 16 de abril de 2020

A Revolução Copernicana e o problema da origem do Universo


Desde que o ser humano existe, ele costuma se perguntar sobre a origem de tudo quanto vê. Suas primeiras impressões lhe dizem que ele habita uma superfície extensa, que chamou de "Terra", e que ao redor desta superfície existem outros corpos, muitos dos quais ele consegue ver a olho nu: o sol, a lua, alguns planetas e as estrelas. É natural, então, que ele se pergunte como tudo isso surgiu.

A sua visão natural parece lhe indicar que a terra é um plano fixo ao redor do qual giram as estrelas, o sol e a lua. As primeiras teorias, assim, afirmavam que a terra ocupava uma espécie de centro, e ao seu redor gravitavam os corpos celestes, aqueles que habitavam no céu. Estes corpos dividiam-se em dois tipos: os que se moviam (chamados de planetas) e os fixos (chamados de estrelas). Estes últimos, as estrelas, estavam pregadas na superfície escura que era, então, chamada de "abóbada celeste".



Este modo de ver ficou conhecido como sistema geocêntrico (Geo = Terra; Cêntrico = Centro) ou sistema ptolomaico, pois Ptolomeu foi o seu primeiro sistematizador, isto é, a pessoa que transformou essas ideias numa teoria organizada.



Esse sistema perdurou até o começo da modernidade. Nicolau Copérnico, um astrônomo, formulou uma teoria que contrariava o sistema geocêntrico. Segundo ele, não era a Terra que habitava o centro do universo, mas o sol. Este novo sistema contradizia não só a visão astronômica anterior, mas abalava igualmente a religião. Com efeito, a Cristandade, entendendo ser o homem o centro da criação de Deus, via como muito conveniente que ele habitasse o lugar central do universo. Agora, porém, com a nova teoria, a Terra era jogada ao escanteio, e aparecia não mais como um espaço privilegiado, mas apenas como um planeta entre outros. A centralidade do homem como imagem de Deus recebia um golpe, e a Religião, tendo as suas teorias contrariadas pelos fatos, viu-se desacreditada. Toda a sociedade dessa época era profundamente religiosa, de modo que esta mudança produziu uma espécie de crise existencial, motivo pelo qual ficou conhecida como "Revolução Copernicana".

Galileu Galilei, aperfeiçoando os estudos de Copérnico e desenvolvendo métodos de observação direta dos corpos celestes, estabeleceu de vez a verdade do heliocentrismo, isto é, de o Sol ser o centro (Helio = Sol), e não a terra. O nosso planeta, antes visto como uma extensão fixa, era agora identificado como um corpo errante, isto é, que se move e que gravita o sol, como os outros planetas.


Atualmente, conforme o tempo passa, os métodos e instrumentos de observação vão ficando mais sofisticados e permitindo uma observação sempre mais completa do universo. As mesmas perguntas do começo, isto é, de como tudo surgiu, continuam a ser feitas, ainda que agora tenhamos respostas mais complexas e elaboradas do que antes. A hipótese criacionista, embora tenha recebido ali um golpe, ainda que não fosse intenção dos defensores do heliocentrismo - que eram ambos religiosos -, nunca foi inteiramente abandonada. Toda a cristandade continuou atribuindo a origem do universo à ação direta de Deus. Mas quanto ao modo isso como o Universo foi feito, não se sabe e não há uma resposta definitiva. A teoria mais aceita quanto a este problema é a do Big Bang. Segundo ela, o universo teria surgido a partir de uma grande explosão. Além destas, há ainda outras teorias: a da eternidade do universo, a de que haja, não um, mas múltiplos universos (teoria do multiverso), não sendo possível definir qualquer começo, etc.



As duas teorias mais famosas, a criacionista e a do Big Bang, geralmente são vistas como opostas e mutuamente excludentes. O Big Bang ganhou fama de ser uma teoria ateísta, que tenta dispensar Deus do processo de surgimento do universo. Embora ateus possam tranquilamente defender essa teoria, não é o caso que o seu primeiro defensor fosse um ateu. Era, na verdade, um padre, o Pe George Lemaitre, que a chamava de "hipótese do átomo primordial".

Assim, as teorias do Big Bang e do Criacionismo não são opostas, mas harmônicas. Uma pessoa pode defender as duas ao mesmo tempo. Há mesmo quem afirme que o Big Bang não somente permite, mas exige a existência de Deus, como se pode ver no vídeo abaixo.